“Às sentinelas que perscrutam a noite prenunciando a nova luz da aurora: a fim de que o desejo fecunde o tempo de espera, a profecia reaviva a memória e o coração se expanda para a esperança (Brasa C., Recisa Virescit, X,15)

Nós cristãos da pós-modernidade corremos o risco de viver uma espiritualidade do “sábado santo”: uma espiritualidade da confusão e da desolação, da ineficácia e da impotência, da tristeza e do desânimo. Corremos o risco de secar por dentro e perdermos a simplicidade, o amor, a ternura.

O tédio e a tristeza chegam quando aceitamos tudo passivamente, quando fazemos as coisas por fazer, quando nos guiamos por aparências e não por convicção daquilo que somos e fazemos, quando não damos um passo para melhorar nossas atitudes, nossa forma de pensar e de agir” (José Luiz Martinez).

Não é este o momento de permanecermos imóveis só porque o caminho está obscuro e inexplorado. O que deve impulsionar a vida cristã atual é a espiritualidade da criação, da iniciativa, do momento presente. Vivemos um momento importante, único, num tempo de renascimento em estado embrionário, num momento de absoluto compromisso com a vida.

E o que agora acontece é a tarefa de uma santa tenacidade e de um zelo indomável que permite aos jovens esperar o impossível e aos velhos estar dispostos a começar de novo. Como Jacó, depois de trabalhar por Lia, é tempo de começarmos de novo, desta vez para alcançar nosso objetivo primeiro. Conhecemos bem o significado de uma vida que começa sendo uma coisa mas se converte em outra, daí a necessidade de começar de novo com o espírito inicial.

Não se trata de um contratempo pessoal

No livro do Gênesis, Jacó se propõe conseguir uma coisa e se encontra frente a uma tarefa distinta. Ele trabalha primeiro sete anos por Lia, a esposa que não desejava, e depois, ainda impulsionado por sua decisão original de vida, trabalha mais sete anos por Raquel, a esposa que desejava desde o princípio, mas cuja entrega lhe foi demorada. Não se tratava tão somente de um contratempo pessoal, de um desafio vital, de um momento de luta, mas para Jacó foi também um ato de fé pessoal, que plantou a semente de um mundo novo para todo o povo eleito. Nas duas situações Jacó trabalha com a mesma intensidade, com igual fervor, com idêntica entrega.  Em ambos os casos Jacó nunca mede esforços, nunca abandona, nunca desanima, ainda que cada situação fosse diferente.

Jacó nos ensina a constância de espírito em tempos de mudança nos mostra que as contrariedades em nossos projetos vitais não são tão graves como cremos. Graças a ele compreendemos que nem sempre somos capazes de reconhecer o valor do momento da vida pelo qual atra-vessamos. Em Jacó nos damos conta de que os contratempos simplesmente sintonizam de novo o coração com coisas mais importantes e nos fazem escutar a primeiríssima voz,  o primeiro som que comoveu nossas entranhas. O que Jacó nos ensina é, sobretudo, que não é a mudança que ameaça a nossa vida, mas o coração estreito que nos esvazia e nos destrói.

Quando o fogo se apaga, quando as brasas se esfriam, quando se deixa de alimentar o ardor do coração, não é o frio que mata, mas a incapacidade para reavivar a chama que em outro tempo conservávamos em nosso interior. Agora deixamos que se convertesse em uma fumaça sufocante que afoga o coração e confunde a mente, que fadiga o corpo e mata a alma. Quando foi concedido a Jacó o direito de casar-se com Raquel, o sonho de sua vida, assumiu também um desafio que ia muito mais além daquilo que jamais havia imaginado. Recebeu uma segunda vida.

Somos impulsionados, continuamente

Todo instante somos induzidos a romper com a vida formal e convencional, a vida ordenada com normas claras e recompensas seguras, o exercício de virtudes pessoais e caminhar para uma vida mais audaz e incerta, de horizontes amplos, de exigências que nos obrigam a começar de novo, de significado mais universal. Despertar a motivação e a intenção daquilo que vivemos e fazemos: Por quê? Para quem? Quando? Temos um coração maior que o mundo e desejos que nos fazem ter asas de águia.

Texto Bíblico  Gn 29,1-30 / Is 35,1-10 / Is 40,27-31

 

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