“A mediocridade não tem lugar na cosmovisão de Inácio” (P. Kolvenbach)

Estamos mergulhados numa cultura de resultados. Isso gera pessoas ansiosas, competitivas, frustradas, dependentes, carregadas de desencanto. A vida torna-se maquinal e rotineira, vivemos uma quantidade de experiências rápidas, amontoadas, superficiais. Sem possibilidade de uma avaliação tranquila para desfrutar das atividades mais simples e humanas, por viver num mundo que enfatiza o dever, as obrigações, o estar ocupado, o produzir. Poucos se perguntam: Que fazem? Por que fazem? Tem sentido o que fazem? Para quê e para quem fazem?

Método dos Exercícios: evolução lenta, longas preparações, repetições, avaliações. Para que haja uma experiência profunda e durável é necessário tempo (contrário do mundo atual: apressado, superficial, descartável). Não há progresso espiritual se não se tira o maior proveito possível das lições que nos vem das experiências anteriores.

Quando a avaliação é regra de ouro

Santo Inácio não é um teórico. Vive, observa, descreve, relata, avalia, e finalmente devolve à ação. Ele sabe que a experiência é mestra e formadora, mas somente a experiência relida, rebatida, solidificada, saboreada, ava-liada. O que constrói a pessoa interiormente é a retomada permanente das experiências que viveu. Aquele que não se debruça sobre o quanto viveu permanece na superfície de si mesmo.

O retorno a uma experiência anterior através da avaliação (exame) é um exercício de discernimento (escuta interior, ressonâncias, sentir-se afetado, tocado). É estar atento às lições  de Deus, às marcas que Ele vai imprimindo em nossos corações. Significa voltar e querer voltar onde já esteve o Espírito; trazer à memória para saborear de novo.  “Aquilo que a memória amou fica eterno” (Adélia Prado).

Trata-se de conhecer e de se apropriar da maneira de agir de Deus. Significa, sobretudo, acolher aqueles momentos densos, que foram como que irrupção de Deus, surpresa e novidade que nos afetaram e que nos conduzem a uma atitude de louvor e agradecimento.

Avaliar é reviver, recordar, visitar de novo aquilo que o coração guardou, é muito mais um retorno aos sentimentos (impacto afetivo) – “o afetivo é o efetivo”.  Na dinâmica dos Exercícios Espirituais só acontece uma experiência sempre que se dá uma modificação afetiva. A avaliação não é uma leitura moralista dos atos externos (o certo e o errado).

Na avaliação, trata-se de um método de decantação progressiva, de concentração sobre aquilo que é essencial, iluminante, nutriente. É deixar o superficial inútil para deter-se nos aspectos que foram fecundos. É estar aberto às surpresas e novidades da vida. Na avaliação, trata-se de uma sabedoria espiritual que diz que a atenção não pode atender a muitas coisas ao mesmo tempo, sob pena de se perder no meio delas e não obter nenhum fruto.

A avaliação ajuda a perceber

O fruto vem da atenção que se concentra, não em muitas coisas, mas no essencial. O que sacia e satisfaz nosso interior não é o muito saber, mas sentir e saborear as coisas internamente. Através da avaliação realiza-se um processo de interiorização  (ir até às raízes do coração) e uma assimilação progressiva de um determinado conteúdo. Através da avaliação temos acesso ao manancial de energias criativas, de iniciativas, de impulsos para uma permanente busca.

Nesse sentido, a avaliação passa a ser o lugar onde se elabora a nossa sensibilidade mais profunda, é o espaço contemplativo onde a vida é lida e saboreada em todas as suas dimensões, onde cada fato, cada experiência, cada momento, mesmo os mais insignificantes, adquirem uma amplitude bem maior.  Avaliar ajuda a tomar consciência do fio de ouro, o processo de continuidade, a sequência natural dos conteúdos saboreados.

A pessoa inteira se recolhe para o essencial e colhe o fruto maduro. Este fruto é o “trampolim” para o passo seguinte, que é a avaliação que não se fixa no passado, mas é abertura para o futuro: acolhe as experiências passadas e impulsiona para o novo.

Santo Inácio não se contentava e nem se acomodava naquilo que conseguia. O fruto conseguido era ponto de partida para algo novo. Na dinâmica do magis, impulso a buscar mais, o maior, pondo o coração naquilo que se faz.  

Texto Bíblico  Mc 6, 30-44

 

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